Entenda como níveis elevados de ansiedade afetam a capacidade de memorização
Ansiedade é um tema que já faz parte do nosso dia-a-dia, seja no ambiente de trabalho, acadêmico ou até em uma conversa entre amigos, o tema acaba por surgir em algum momento. Não é surpresa que com um estilo de vida cada vez mais acelerado, todos nós já tenhamos experimentamos algum nível de ansiedade. A ansiedade pode desencadear uma série de sintomas e um deles, menos conhecido, está relacionado a memória. No texto a seguir iremos apresentar o conceito de ansiedade e como ela pode afetar nossa capacidade de memorização.
Sabe aquele frio na barriga antes de falar em público, o coração acelerado ao perceber que podemos nos atrasar ou até mesmo pensamentos antecipatórios que nos impedem de dormir à noite? Essas podem ser algumas formas de manifestação da ansiedade. Porém, quando a ansiedade se encontra elevada pode surgir um outro sintoma.
Aquela chave que some bem na hora em que precisamos sair, aquele e-mail importante que deveria ter sido enviado, aquele branco na hora da prova. Essa podem ser manifestações ligadas a altos níveis de ansiedade. Mas antes de explorarmos como a ansiedade afeta a memória precisamos compreender o que é esse fenômeno do nosso organismo.
O que é memória?
A memória é um processo cognitivo que tem por finalidade armazenar e recuperar informações e ocorre através de 3 etapas distintas: a codificação, o armazenamento e a recuperação.
- Codificação: Processo pelo qual informações são aquiridas. Neste momento inicial as informações percebidas pelos sentidos (visão, audição, tato, paladar, olfato, cinestésico e vestibular), são coletadas e modificadas para serem armazenadas da melhor maneira.
- Armazenamento: O armazenamento pode ocorrer de diferentes formas, as quais possuem relação com tipo (memória episódica, semântica e processual) e o tempo que informações codificadas anteriormente necessitam estar na memória (memórias de curto, médio e longo prazo).
- Recuperação: É o processo pelo qual as informações armazenadas são acessadas. Ou seja, o ato de lembrar.
A memorização envolve uma série de etapas as quais dependem dos processos atencionais. Habilidade importantíssima que é afetada quando os níveis de estresse e ansiedade estão elevados.
O papel da atenção
A memória envolve uma série de etapas, nas quais os processos atencionais possuem um papel fundamental. Os processos atencionais estão ligados às funções executivas e podem ser classificados em diferentes tipos, alguns deles são:
- Atenção Concentrada: É a capacidade de estar atento a uma só tarefa, ou seja, de se concentrar um único objeto.
- Atenção Alternada ou Dividida: Habilidade de intercalar o foco da atenção entre diferentes tarefas, de acordo com a necessidade.
- Atenção Sustentada: Capacidade de manter a atenção em determinado estímulo por um longo período.
A atenção pode ser afetada pela ansiedade pois quando estamos ansiosos nosso cérebro se prepara para agir e o foco se torna o objeto de ameaça, seja ela físico ou psicológico. Mas nem sempre isso é algo ruim.
Ansiedade mocinha ou vilã?
Apesar do significado popularmente atribuído ao termo ansiedade, como algo desagradável que precisa ser combatido, a mesma é uma reação natural do organismo frente a possibilidade de um risco, no qual o corpo se prepara para reagir fugindo, paralisando ou lutando.
Ao perceber uma ameaça, seja ela física ou psicológica, o sistema nervoso simpático é ativado. Em uma fração de segundos, adrenalina é liberada na corrente sanguínea que faz com que o coração bata mais rápido, aumentando a pressão e dilatando os brônquios, o que aumenta a capacidade respiratória, fornecendo mais oxigênio e nutrientes aos músculos. Enquanto o corpo todo se prepara para a lutar ou fugir a atenção se concentra na ameaça percebida.
Quando estamos diante de uma situação que nos parece um risco, seja ela, uma freada brusca enquanto estamos atravessando a rua, ou a expectativa de apresentar aquele trabalho na frente da turma, todo o nosso organismo reage, provocando sensações como, coração acelerado, suor frio, frio na barriga, entre outros. Tudo isso é uma reação normal e importante do ponto de vista evolutivo e possui o objetivo de nos preservar de ameaças.
Mas o problema está quando essas reações são ativadas em momentos que não deveriam ou em excesso. Em outras palavras, em vez nos ajudar acabam por atrapalhar. É importante notar que nem toda ansiedade é prejudicial. Pelo contrário, um certo nível de ansiedade pode ajudar a melhorar o desempenho da memória ao nos tornar mais alertas e focados.
Medo ou ansiedade?
As reações anteriormente citadas podem ser desencadeadas tanto em situações de medo como em situações de ansiedade, mas qual seria a diferença entre as duas manifestações?
O medo é uma reação ativada diante de um risco real, por exemplo, ao avistar um cão raivoso é natural que tenhamos medo. A diferença é que, na ansiedade as reações são ativadas diante de algo que ainda não ocorreu. Ainda utilizando o exemplo do cão raivoso, podemos considerar ansiedade quando o indivíduo ao imaginar a possibilidade de encontrar um cão raivoso, mesmo sem uma relação concreta com o fato, vivencia essas sensações.
Como a ansiedade afeta a memória?
Como falando anteriormente, quando estamos ansiosos a atenção se volta para a ameaça percebida. Dessa forma, quando estamos em estado de alerta, a ansiedade pode afetar a memória de várias maneiras, algumas delas são:
- Dificuldade de Concentração: Quando estamos ansiosos se torna difícil concentrar-se em uma tarefa. A falta de concentração pode tornar mais difícil assimilar informações e codificá-las, afetando todo o processo de memorização.
- Memória de Trabalho Reduzida: A ansiedade pode sobrecarregar a memória de trabalho, responsável por manter informações por um breve período, para serem utilizadas em tarefas imediatas. Isso pode levar a esquecimentos.
- Confusão: Níveis elevados de ansiedade causam confusão mental, podendo afetar a capacidade de lembrar informações recentes ou detalhes.
- Acesso à memória: Quando ansiosa, uma pessoa pode encontrar dificuldade em acessar informações armazenadas na memória de longo prazo, mesmo que essas informações estejam lá. O famoso branco. Após a redução da ansiedade o indivíduo tende lembrar da informação esquecida.
- Memória Seletiva: A ansiedade pode alterar como acessamos nossa memória. Quando ansiosos tendemos a lembra principalmente informações relacionadas ao motivo da ansiedade.
- Memória Distorcida: A ansiedade também pode levar a distorções na memória. Assim, os eventos tendem a ser lembrados de maneira mais negativa.
Quando estamos ansiosos nosso corpo libera hormônios do estresse, como o cortisol, os quais, quando em altos níveis podem prejudicar a função do hipocampo, área do cérebro importante tanto na formação de novas memórias, quanto na recuperação de memórias antigas.
É importante destacar que a relação entre ansiedade e memória é complexa e varia de pessoa para pessoa, sendo presente em alguns casos com mais intensidade do que em outros.
Ansiedade ou TDAH?
Com a ampla divulgação dos transtornos mentais nas mídias e redes sociais, não é incomum que problemas de atenção e memória devido à ansiedade sejam confundidos com TDAH.
O TDAH é um transtorno neurobiológico caracterizado por desatenção, impulsividade e agitação. O indivíduo com TDAH tem seu funcionamento afetado desde a infância, frequentemente levando a problemas escolares. Um outro ponto importante é que, em casos de TDAH o cérebro do indivíduo pode apresentar diferenças estruturais quando comparado ao cérebro de pessoas que não possuem.
Os sintomas de ansiedade podem se manifestar de forma mais intensa em situações estressantes, o que pode levar a uma hipótese diagnóstica inicial de TDAH. Portanto, recomenda-se que a avaliação seja contínua e que inclua aspectos relacionados ao histórico de vida e psicopatológico do indivíduo e sua família, para identificar e monitorar como os sintomas se comportam ao longo do tempo.
O diagnóstico diferencial é crucial para direcionar o tratamento adequado. Apesar das semelhanças, a ansiedade e o TDAH são quadros diferentes que podem ou não estar sobrepostos. O TDAH deve ser tratado com medicamentos específicos e adaptações. A ansiedade é frequentemente tratada com psicoterapia, para facilitar o entendimento e manejo da mesma, em conjunto com medicação ansiolítica.
Os sintomas de ansiedade podem ser incômodos, mas é importante levar em consideração a intensidade, frequência e como afeta o dia-a-dia, pois quando em níveis aceitáveis pode ser uma importante ferramenta para nos mover em direção a realização de objetivos e metas. Por outro lado, quando em excesso pode se tornar prejudicial, afetando o funcionamento do indivíduo e causando problemas com a atenção. Por isso, devemos observar como anda nossa relação com a ansiedade e procurar ajuda profissional quando a mesma afetar nosso bem-estar e qualidade de vida.