Como deve ser pautada a atuação dos profissionais de psicologia ao trabalhar com esse público? Descubra!
Em um mundo carente de inclusão, a jornada para a autodescoberta, aceitação e expressão pode ser desafiadora, nesse sentido o acolhimento à comunidade LGBTQIAPN+ surge como uma importante ferramenta. O texto a seguir se propõe a discutir o papel do psicólogo na atenção e promoção da qualidade de vida desse esse público, observando as diretrizes do CFP sobre o tema.
Apesar de terem conquistado uma maior visibilidade ao longo dos anos, devido às lutas por direitos e reconhecimento, pessoas que se identificam como lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros, queer, intersexuais e outros, frequentemente vivenciam o preconceito e discriminação em inúmeras esferas da vida, incluindo: familiar, social, no mercado de trabalho, entre outros.
Vulnerabilidade
Pessoas LGBTIAPN+, podem ser consideradas uma parcela vulnerável da população, apesar dos recentes avanços na direção do reconhecimento e conquista de direitos. Ainda nos dias de hoje existem tabus e preconceitos acerca de questões de gênero e sexualidade que frequentemente levam essas pessoas a vivenciarem ao longo de suas vidas, de forma direta ou indireta, todo um contexto social que pressupõe e/ou impõe um ajustamento heteronormativo. O que pode resultar em ações de preconceito e até violência, voltados a esses indivíduos.
Dados do Dossiê de Mortes e Violências contra LGBTI+ no Brasil 2022, indica que no ano passado 273 pessoas LGBTIAPN+ morreram de forma violenta, sendo que travestis e mulheres trans representaram 58,24% do total de mortes; gays representaram 35,16%; homens trans e pessoas transmasculinas 2,93%; mulheres lésbicas 2,93%; pessoas bissexuais 0,37%; e pessoas identificadas com outros segmentos 0,37%.
Os pontos anteriormente citados podem fazer com que alguns desses indivíduos sintam que devem adequar sua orientação sexual ou identidade de gênero ao que é socialmente esperado, como uma forma de evitar serem vítimas de preconceito ou violência, mesmo que isso não corresponda a sua individualidade. O que pode acabar por afetar seu bem-estar e saúde mental em diversos níveis.
Nesse sentido, o profissional de psicologia, em sua prática junto a esse público, deve adotar uma postura ética, respeitosa e livre de julgamentos, com respeito à individualidade e dignidade da pessoa LGBTQIAPN+. Adotando uma visão ampla, considerando todo o contexto que em que o paciente/cliente está inserido, buscando uma prática que vá além de um recorte individualista do sofrimento mental.
Terapias de Reorientação Sexual vs Ética Profissional
Um ponto debatido até poucos anos atrás, as “terapias de reversão”, eram alimentadas por posicionamentos sociais, religiosos e de saúde mental. Mesmo após a homossexualidade ser retirada da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID) nos anos 1990, infelizmente ainda podem existir resquícios desse pensamento.
As terapias de conversão sexual são rejeitadas pelo CFP pois violam a dignidade da pessoa LGBTQIAPN+. Segundo a Resolução CFP nº 01/1999, que estabelece normas de atuação para os psicólogos em relação à questão da Orientação Sexual, é antiético e inadequado para os psicólogos realizarem tais práticas. “a forma como cada um vive sua sexualidade faz parte da identidade do sujeito, a qual deve ser compreendida na sua totalidade”. CFP N° 001/99).
Ainda segundo a Resolução CFP n°01/1999, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) estabelece diretrizes claras sobre o tema, proibindo esse tipo de prática, também conhecida como “cura gay” ou terapias de reorientação de gênero, assim como qualquer tipo de contribuição ou participação que contribua com a patologização, preconceito e estigma sobre questões de orientação sexual. Alguns trechos podem ser conferidos abaixo:
• Art. 3° – os psicólogos não exercerão qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas, nem adotarão ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados. Parágrafo único – Os psicólogos não colaborarão com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades.
• Art. 4° – Os psicólogos não se pronunciarão, nem participarão de pronunciamentos públicos, nos meios de comunicação de massa, de modo a reforçar os preconceitos sociais existentes em relação aos homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica.
É fundamental compreender que a orientação sexual e a identidade de gênero não são patologias a serem tratadas, mas aspectos inerentes à diversidade humana.
O papel da Psicologia
É necessário promover a inclusão, o respeito e o combate à discriminação, dentro em todas as esferas sociais de forma contínua, incluindo no âmbito da saúde mental. É imprescindível que, desde o início da formação, os profissionais de psicologia sejam orientados acerca da importância de uma prática ética e acolhedora para a comunidade LGBTQIAPN+.
Os profissionais psicólogos devem estar preparados para compreender as especificidades das questões de gênero e sexualidade, bem como desenvolver as habilidades necessárias para fornecer apoio e tratamento que respeitem a individualidade e a dignidade de cada pessoa.
A psicologia desempenha um papel crucial na promoção da saúde mental e no bem-estar desses indivíduos, combatendo o estigma e auxiliando na construção de uma sociedade mais inclusiva e equitativa.
Cabe ao profissional de Psicologia acolher o cliente/paciente, respeitando sua condição sexual e identidade de gênero, sem buscar alterá-las. O foco das intervenções realizadas deve ser o bem-estar, o apoio emocional e o respeito pela autonomia e singularidade de cada indivíduo. O atendimento deve proporcionar um ambiente seguro e inclusivo, no qual as pessoas LGBTQIAPN+ se sintam à vontade para expressar suas emoções, compartilhar suas experiências e buscar apoio sem o medo de serem julgadas ou discriminadas.
Em casos em que a paciente expressa preocupação com seu interesse por pessoas do mesmo sexo, o profissional deve promover o entendimento e a aceitação de sua orientação sexual facilitando o paciente a obter informações, desfazer estereótipos e desconstruir preconceitos internalizados. O profissional deve investigar cuidadosamente as razões por trás dessa demanda.
Com frequência, esse desejo pode ser resultado de pressão social, conflitos internos e/ou normas culturais ou religiosas que rejeitam a diversidade sexual e de gênero. O papel do Psicólogo é oferecer um espaço seguro para reflexão, autoconhecimento e apoio emocional, sem buscar mudar a identidade do paciente.
Ao trabalhar com pessoas LGBTQIAPN+, os profissionais de saúde mental também devem estar atentos às suas próprias atitudes, preconceitos e crenças pessoais. É fundamental relembrar que a orientação sexual e a identidade de gênero são aspectos intrínsecos da pessoa e não devem ser patologizados.
O psicólogo deve buscar uma atualização constante sobre questões relacionadas à diversidade sexual e de gênero, além de desenvolver uma postura de respeito, empatia e não-julgamento, possibilitando a construção de uma relação terapêutica sólida e eficaz. Devemos acolher, compreender e observar a diversidade humana, promovendo uma prática inclusiva que garanta o respeito à dignidade humana.